links amarelos #3
minha seleção de novembro
Em tempos ideais, eu (uma relutante designer de produto), me sento com um lanchinho gostoso em mãos e passo horas em vadiagem digital. No final, me levanto com o bolso cheio de artigos, livros, filmes, músicas e outras coisas ainda sem lugar na taxonomia digital vigente. Os links amarelos são o creme de la creme dessa vadiagem, aprecie.
Antes de seguirmos para os links amarelos, deixo aqui um link amarelíssimo (um link amarelo criado por mim). Eu realmente sou designer e não tem muito como explicar de quê sem um portfólio, então tá na mão: adandara.com.
Espero que essa seção apareça mais vezes por aqui no futuro.
Agora sim, retornamos para a programação regular.
no mês de novembro temos: violões, mas de um jeito que eu os respeite ✦ Beyoncé, finalmente! ✦ maestros ✦ joan didion ✦ o sol ✦ os dois lados de um taco de baseball ✦ a dua lipa
como sempre, começamos com música
É chocante que essa tenha sido a experiência musical mais interessante do meu mês porque eu sou contra violão. Quando se odeia violão também se odeia covers porque eles são como o ovo e a galinha, é difícil saber qual mal veio antes. E eu digo tudo isso antes de te recomendar o cover da Irma de Thriller do Michael Jackson.
Recomendo porque: o vídeo carregou e tinha uma mulher linda me encarando; essa mulher começou a tocar e a cantad; e então entram dançarinos e ela começa a seguir o ritmo deles ainda cantando e tocando; por fim a mulher está dançando a coreografia de Thriller enquanto toca violão e canta. Não é qualquer violão!



Segui mergulhando na discografia da Irma. Ganhei uma nova música favorita (Trouble Maker) e também descobri o clipe de Save Me que faz um jogo de interação com projeções muito interessante. A visualidade automaticamente me lembrou da apresentação de Beyoncé de Run The World no Billboard Music Awards de 2011.


Se o clipe era de 2013 e a apresentação da Beyoncé de 2011, será que os mesmos artistas estavam envolvidos? Boa pergunta! A resposta infelizmente é não.
Quem fez o visual do vídeo da Irma foi a SUPERBIEN portfólio incrível não deixem de explorar e quem fez a projeção da Beyoncé foi uma empresa que pelas minhas pesquisas não existe mais, mas deu uma entrevista bem interessante que você pode ler aqui.
não dá pra continuar sem falar da Beyoncé
É de um milagre tremendo que eu tenha conseguido escrever duas issues antes de falar da Beyoncé. Minhas tatuagens da mulher estavam quase pulando da pele. Mas finalmente arrumei um motivo.
Nos comentários da apresentação da Billboard tem esse comentário hilário:
Alguns dias depois de ver o vídeo eu li esse texto: Are You Playing to Play, or Playing to Win? Uma recomendação aberta para todos, mas especialmente válida para pessoas no meio do esporte, artístico ou qualquer outro que coloque sua vida num pódio igualmente eterno e momentâneo.
A principal ideia do texto é que muitas das vezes nós estamos inventando mais regras do que o necessário para nos sentirmos vencedores. O exemplo mais acessível é a experiência de jogos de luta em que algumas pessoas se recusam a jogar usando alguns golpes específicos por consideram roubar e outras, como dois dos meus amigos próximos, usam uma abordagem de que: “se tá no jogo é pra usar”.
Em teoria, se você venceu usando os golpes mais difíceis ou mais irritantes, não importa, você venceu. Se você só acha digno vencer com os golpes mais difíceis, beleza, mas é você quem tá inventando e jogando esse outro jogo. E se você joga esse jogo digno e perde, talvez você possa considerar apenas o jogo com tudo que há para se usar nele na próxima partida.
Mas se você adiciona regras no feijão com arroz e ainda assim vence, aí você é um Maestro.
Um exemplo mais mainstream pode ser o Roger Federer. Federer usa o backhand de uma mão só — uma técnica notoriamente mais difícil do que a versão com duas mãos. E ele também faz isso parecer fácil. A gente não ama ele por isso, é claro — a gente ama ele porque ele faz isso enquanto domina os níveis mais altos do tênis — pelo menos pela maior parte de duas décadas. E, então, assistir o Federer jogar uma partida de tênis é como ver Deus jogar tênis — ou talvez, melhor dizendo, como assistir uma versão do tênis que é mais balé do que um esporte de raquete.
E o que a Beyoncé tem a ver com isso?
A Beyoncé está jogando um jogo que ela mesma inventou as regras e temo dizer que na maior parte do tempo nem nós (fãs) sabemos quais são as regras. Nós todos somos surpreendidos pelo sarrafo técnico que ela insiste em jogar pra cima toda vez que entra em turnê — ou as vezes nem turnê, ela também fez isso com shows únicos ou duplos que nunca foram repetidos, com apresentações na NFL ou com álbuns surpresa.
Eu a chamaria de pioneira se ela fizesse algo e isso tornasse possível que outros fizessem em seguida. Mas as vezes acho que nem ela conseguiria fazer certas coisas de novo. Ela opera num nível diferente, joga com regras autorais que tornam difícil e até injusto compará-la com outras pessoas que ouvimos, assistimos ou brigamos por ingresso.
E caso não tenha percebido, ela está vencendo o jogo.
ninguém vira maestro por acidente
Eu já falei da Beyoncé numa entrevista de emprego. E consegui o emprego. E sim a pergunta era: “quem é a pessoa que você mais admira”.
Consegui escrever uma resposta linda sobre ética de trabalho e determinação. Se você lê ou ouve qualquer pessoa que já trabalhou com ela (por exemplo, o texto que recomendei ali em cima) você acha que é completamente natural e lógico ela conseguir produzir o que produz.
E é completamente natural e lógico falar isso da Beyoncé. Mas ninguém pode buscar querer falar disso de si mesmo ou do próprio trabalho.
Principalmente na minha geração — eu tenho 23 anos — estamos cada dia mais confortáveis em dizer que não tentamos tanto, que não estávamos tão aí, independente se estamos falando de um sucesso ou uma falha.
É como se estivéssemos presos no corpo de um adolescente que quer convencer seus amigos que não estudou tanto assim e aquele 10 foi uma completa surpresa.
Muita gente acredita que há uma praga do cinismo rondando por aí. Nada é tão sério assim. Esqueceu que o mundo tá acabando? O mundo tá acabando e você quer se esforçar?
Relaxa, o rumo desse texto também me faz estremecer de medo. Será que eu estou prestes a te meter um link de coach?
Não.
Mas me recuso a acreditar que essas são as únicas vias da vida adulta. Me recuso a acreditar que seja vergonhoso bater no peito e admitir que tentou com vontade. Me recuso a acreditar que o cinismo é a resposta.
E o visakan veerasamy também se recusa:
Cinismo é um mecanismo de defesa completamente razoável contra fraudes e palhaçadas. Mas o problema do cinismo como mecanismo de defesa é que você pode se tornar tão bom nisso que você inadvertidamente também se defenderá de coisas boas acontecerem com você.
Are You Serious?
Acho até que o cinismo extremo é uma tremenda falta de respeito consigo mesmo. Imaginar não levar nada a sério!
Tenho palavras da Joan Didion pra Vogue em 1961 que ponderam sobre isso:
Para dar ás cartas não respondidas o peso devido, para nos livrar das expectativas dos outros, para nos dar de volta á nós mesmos — para isso existe o grande, o singular poder do auto-respeito. Sem ele, eventualmente se presencia o cair da última gota: você foge para encontrar a si mesmo e não encontra ninguém em casa.
os frutos que se colhe ao levar alguma coisa a sério
Esse mês fiz o retorno de uma consulta médica que precisou começar com um repasse de tudo que eu havia apresentado de queixa na primeira consulta. Enquanto o doutor falava, eu ficava abismada com quanta coisa eu havia mencionado antes—quer dizer, com quanta coisa eu estava passando naquela época.
No espaço de tempo dessas duas consultas eu decidi levar meu corpo e minha mente muito mais a sério e num espaço de tempo tão curto eu e todos ao meu redor vimos mudanças tão grandes que aquela pessoa sendo descrita pareceu uma caricatura.
Todo o parágrafo que eu escreveria em seguida pode ser encapsulado por esse texto tão curto quanto profundo: the third chair do Henrik Karlsson.
Mas ainda não acabou. Eu ter saído dessa consulta bem melhor do que entrei na última não quer dizer que posso deixar as coisas desandarem, me render aos estresses antigos, pular as corridas dessa semana ou da outra. Se a gente leva a sério a gente tem que se empenhar todo dia.
Porra, todo dia? Sim. Até porque todo dia é tudo que a gente tem.
INTERVIEWER: There’s a certain esthetic to the way you live. You once talked about using good silver every day.
DIDION: Well, every day is all there is.
eu levo essa newsletter a sério
Essa newsletter também é fruto de uma tentativa de melhora, tentativa de ser feliz. A linha de raciocínio era que talvez não fosse tão sustentável e interessante a curto, médio ou longo prazo ignorar os impulsos criativos e a vontade incessante de falar de alguns assuntos. Talvez na verdade o que estava me sufocando era nunca ter espaço e tempo para isso. Era verdade. Eu adoro isso aqui.
Tenho planos pra essa newsletter. Na verdade tenho planos pra tudo na vida porque planejo ficar por aqui. No que tange a esse cantinho, eu gostaria:
De tomar café com alguém que me conheceu só por aqui e pensou caramba, eu também sempre quis falar sobre isso.
Comprar um microfone pra que os links amarelos também tenham uma versão em voz e vídeo para outros canais.
Comprar uma impressora para explorar melhor alguns textos e ideias que o computador não me permite. A vida é tátil e eu gostaria de ser também.
Escrever em outros formatos que, eu admito, ainda seriam curadorias, mas me permitiriam mergulhar de cabeça em algum assunto. Exemplos: tudo que eu sei sobre metas de ano novo, tudo que eu sei sobre museus, tudo que eu sei sobre bom gosto, tudo que eu sei sobre organização pessoal, tudo que eu sei sobre aprender.
Ter um texto meu publicado em algum lugar fora daqui.
Alguma dessas coisas vai acontecer em 2026? Ainda não decidi. Quando decidir tudo vai virar um plano bem detalhado que dará certo e quando me perguntarem se eu esperava isso tudo: eu direi que sim.
porque repito: ninguém vira maestro por acidente
E aqui vão alguns exemplos de pessoas sérias nesse mês de novembro. Começando com dois divos: Andrew McCarthy e Shohei Ohtani.
Andrew McCarthy, também conhecido como Cosmic Background, conseguiu capturar o amigo dele skydiving exatamente na frente do sol. O Andrew humildemente acha que não existe outra foto assim no mundo.
E isso não aconteceu por acidente. Ninguém vai parar no meio do deserto com câmeras ultra-telegráficas e monitores, com seu melhor amigo num avião pronto pra pular no comando da sua voz por acidente. E ninguém edita todas as gravações e fotografias tiradas desse momento por acidente. Uma foto dessa não existe por acidente.
Eu adoraria saber explicar melhor como ele fez isso inclusive, mas depois de ver essa foto eu tô começando a achar que eu não sei como câmeras funcionam.
Eis uma coisa que agora eu sei e vou conseguir te explicar sobre: baseball e Shohei Ohtani. Relaxa, eu vou pegar bem leve com a explicação.
Imagina o taco de baseball. Imaginou? Beleza. Pra ele ser usado tem que ter alguém mandando a bola e outra com o taco rebatendo correto? Ótimo, você já entendeu tudo!
Quem arremessa a bola é o pitcher e quem rebate a bola é o batter. No baseball quando um time está arremessando a bola o outro time está rebatendo e costumam ter jogadores diferentes para cada uma dessas coisas, meio como se o time de defesa e ataque fossem diferentes (o que não rola no futebol que todos os jogadores sempre estão em campo). Mas não é regra, eu usei a palavra costumam porque as vezes o seu melhor pitcher e o seu melhor batter são a mesma pessoa.
Brincadeira, não é as vezes. Isso quase nunca acontece. A não ser que você seja Shohei Ohtani, MVP dessa temporada da MLB, melhor arremessador e rebatedor da liga ao mesmo tempo. O melhor jogador de baseball da atualidade. Alguém tão bom que não tem como comparar ele com nenhum outro jogador ativo e agora quando vão mostrar os stats dele, ou comparam com ele mesmo de outra temporada, ou vão 100 anos atrás na história do esporte pra tentar dimensionar as coisas.


Essa carreira é surpreendente, eu concordo, e também é surpreendente em primeiro momento que o melhor jogador de baseball da atualidade seja japonês. O baseball não era dos Estados Unidos? Vamos ser honestos, o que realmente é dos Estados Unidos? O baseball também é do Japão! O Ohtani é só uma das pérolas nipônicas do esporte como explica esse vídeo.
E agora três divas: Rosalía, Charlie XCX e Dua Lipa.


Tá todo mundo “rosaliado”, “luxiado” e tudo mais. É gostoso quando de tempos em tempos um lançamento deixa o mundo tão animado; quando as pessoas são lembradas do porquê de músicas sequer terem clipes; quando o álbum tem tanto conceito que a gente considera plausível um culto com os fãs no Cristo Redentor.
Dito isso, eu não estou rosaliada e luxiada, mas estou muito feliz que esse álbum existe simplesmente por ele ser de uma entrega tão linda. Agora podemos passar meses — ou semanas, sejamos sinceros — desdobrando o que Rosalía propôs que ouvíssemos e lêssemos.
Pra iniciar a sua aventura luxuosa: leia das mãos de Tara Maria Gonzalez esse texto que aponta a presença do Mike Tyson, de torrões de açúcar e da Branca de Neve em BERGHAIN e continue sua aventura analisando a partitura das cordas de BERGHAIN postadas aqui no substack pela própria R O S A L Í A (nos comentários tem vários músicos dando suas teorias sobre as escolhas e tonalidades abordadas).
A segunda diva, Charli XCX, também tá aqui no substack (charli xcx). Eu não tive um ano muito brat, não consegui compactuar com nada do que ela propõe ali, mas eu consegui compactuar com as suas palavras sobre criação:
Sentir a criatividade em abundância é uma puta benção e um puta alívio. Nem importa se as ideias são boas ou não, só é uma grande euforia sentir a fonte fluir novamente.
(…)
Eu sinto que quando tem esse fluxo tão forte de felicidade e paixão e vitalidade em criar um álbum (as músicas, a linguagem visual, a capa e vinis, o show da turnê, a performance da coisa toda), naturalmente há um sentimento de vazio que se segue depois do projeto ir para o mundo.
É meio óbvio que algo tão bem sucedido como brat tenha sido pensado nos mínimos detalhes e feito com tanto afinco, mas eu estava deixando passar batido até ela me lembrar.
Já em outro texto dela, esse sobre a vida de popstar — um texto muito mais genuíno do que você esperaria — ela discorre sobre o que leu e ouviu sobre sua aparição nessa rede social "tão intelectual” chamada substack.
Há uma dificuldade das pessoas em enxergá-la como uma pessoa capaz de escrever textos e provocar reflexões profundas já que ela é apenas “a garota que usa drogas debaixo da mesa”. Sua argumentação sobre o porquê disso me soou um pouco superficial, mas não deixa de ser válida. E esse é um assunto que eu toquei várias vezes esse mês por conta de outra diva: a Dua Lipa.
A Dua Lipa tava no Brasil. A Dua Lipa cantou com o Caetano Veloso e com o Carlinhos Brown. A Dua Lipa cantou em português. E não foi só “um olha que coisa mais linda, mais cheia de graça” não ein! A Dua Lipa jogou carteado, caiu no samba, assistiu jogo no estádio. A Dua Lipa entrevistou a autora de Conto da Aia, Margareth Atwood, no podcast literário aclamadíssimo que ela lidera.
Te peguei nessa última? Pois é.
A Dua Lipa está há algum tempo sendo uma das principais referências de entrevista que eu carrego. Ela tem conversas incríveis com vários autores, demonstrando um entendimento e cuidado tão grande com o que é do outro, que você não pensaria em atribuir a ela outra arte que não a da escrita.
Entrevistar não é fácil e entrevistar autores é especialmente difícil, se quiser saber porque assista esse vídeo de título maravilhoso: Dua Lipa versus The Literary Landscape. A lista de coisas incríveis que a Dua Lipa faz, poderia aumentar esse email ao dobro e eu já estive aqui por tempo demais.
Vou me ater ao importante que retiramos desses cinco exemplos: todo mundo gosta de acompanhar maestros. Eu não sei tanto sobre o sol, sobre baseball ou sobre a discografia de nenhuma dessas três divas, mas eu sei reconhecer quando alguém tá jogando bonito.
E se a gente gosta tanto de ver um jogo bonito, não tem muito porque achar vergonhoso admitir que queremos jogar sério. Acho que é uma mensagem interessante para carregar no coração de vocês, já que dezembro é o único momento em que tá permitido falar de metas e sonhos sem ser taxado de coach.
Se tem alguma coisa que você gostaria de levar a sério em 2026, bota no papel, bota na cabeça, bota na roda com os amigos. Ou bota na roda nos comentários desse post, eu sou uma líder de torcida profissional. Até porque assim como Tashi Duncan: I just want to watch some good fucking tennis.
e digo mais,
Na issue passada eu recomendei duas apresentações do Snarky Puppy com a Metropole Orkest. Esse mês saiu mais uma! Essa tem 10 minutos e sim, você ainda deveria ver e ouvir.
Esse mês eu passei por um prédio feio e gigante, eu pensei na hora ser a maior smartfit do mundo (elas tão cada vez maiores, né?) mas depois descobri que na verdade era… uma unidade da Igreja da Lagoinha. Ver a Igreja mais feia da minha vida até agora, me lembrou de uma das mais
bonitasinteressantes que já vi na vida.Lançaram um repositório incrível de Livros de Design e o Natal tá chegando, né? Fica aqui a minha Wishlist sempre atualizada.




